CONVIDE O PROBLEMA PARA PARTICIPAR DA SOLUÇÃO
Ayrton Sérgio Rochedo Ferreira
É comum encontrarmos nas empresas pessoas com baixo desempenho e gestores que fazem repetidamente as mesmas reclamações, sem sucesso: “explico-lhes detalhadamente o que quero que façam e, mesmo assim, não fazem certo!”.
Este parece ser o testemunho desanimador de um problema sem solução.
Na história do trabalho humano são tantos milhares de anos dando ordens para obter o que se deseja que quando a máxima “mandar - obedecer” deixa de funcionar provoca em nós perplexidade, frustração e irritação. Logo classificamos como rebeldes ou ignorantes aqueles que nos contrariam, atribuindo somente a eles o problema. Definitivamente, o ego do gestor moderno ainda é ferido pela decepção da contrariedade, tal como ocorria com os feitores no trabalho escravo ou forçado.
No entanto, se o empresário ou gestor se dispuser a fazer um trabalho participativo com os integrantes de sua equipe, convidando-os a discutirem as razões de seus comportamentos, a expressarem suas opiniões sobre a forma como ele os chefia e encorajá-los a sugerirem as mudanças que considerem importantes em seus ambientes funcionais, poderá se surpreender com os resultados: uma boa parte, senão todos os que julgava relapsos, desinteressados e com pouca responsabilidade, demonstrarão disponibilidade e motivação para discutirem os problemas e darão contribuições valiosas para resolvê-los com aplicação.
A idéia que fica da experiência é que essas pessoas pareciam estar anestesiadas e nós as despertamos quando as convocamos para resolver conosco um problema que julgávamos estar sendo causado por elas próprias.
Convidar o problema para participar da solução pode parecer uma estratégia impensável na perspectiva da autoridade prepotente, que se obriga a resolver sozinha o que a aflige. Mas quando se tem a capacidade de envolver pessoas, dando-lhes poder para tomarem parte nas soluções que buscamos, mesmo que as consideremos a causa dos problemas, mobilizamos suas energias para a construção de um valioso atributo em equipe: a participação.
Durante a maior parte da história do mundo empresarial, bastou-nos a obediência dos subordinados para produzir o volume de produtos e serviços necessários e fazer os números acontecerem. A concorrência era menos severa, os clientes muito menos exigentes, as cargas fiscais e sociais muito menores, as regulamentações ecológicas quase nulas e, assim, os custos da indústria e dos serviços eram muito mais baixos por unidade produzida. Para nos mantermos no mercado bastava a produtividade arrancada das pessoas pela boa e velha autoridade. Um par de mãos e um par de orelhas nos atendiam.
O que mudou, de lá para cá, no entanto, não foram as pessoas, mas o nível de contribuição que precisamos receber delas, para o sucesso de nossos negócios.
A partir da segunda metade do século XX a atividade produtiva passou por drásticas transformações:
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O mundo civilizado prosperou com a ajuda da ciência e adicionou milhões de novos consumidores ao mercado produtor de bens e serviços.
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Aumentou o interesse da indústria por uma base de clientes cada vez maior e a concorrência tornou-se muito mais acirrada.
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A sociedade e o estado passaram a marcar mais pesadamente os preços sociais e fiscais nos custos das unidades produzidas.
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O mercado aumentou, não só em volume, mas também em diversidade e alternativas.
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O trabalhador de hoje dispõe de muito mais opções de trabalho do que dispunha no passado, a despeito da quantidade de postos oferecidos.
Neste novo cenário a boa e velha autoridade tornou-se ainda mais velha, mas deixou de ser boa para atender à nova demanda que se desenhou: aumentar e sustentar a produtividade para fazer frente a uma economia mais cara, mais regulamentada, mais competitiva e com maior diversidade de ocupações.
Por isso, o modelo tradicional de gestão baseado somente na autoridade, herança de tantos séculos, começou a dar sinais de esgotamento e não consegue mais produzir o desempenho que nossos negócios precisam para serem sustentáveis.
Além da autoridade, empresários e gestores precisam agora construir propósitos coletivos, por meio de participação, para obterem desempenho e produtividade das pessoas.
A construção de propósitos é uma ação educativa e transformadora, que adiciona significado e sentido ao trabalho das pessoas, tornando-as parte realizadora e interessada de um empreendimento, ao invés de somente parte obediente e interessada na remuneração do trabalho.
Vale uma dica: não adianta começar pensando na velha e gasta participação financeira por resultados. Se não soubermos ajudar as pessoas a encontrarem significado e realização no trabalho que executam sob a nossa liderança, não será o dinheiro adicionado ao salário que resolverá. Boas mesadas não fazem filhos amarem suas famílias, nem serem dedicados ao convívio com os pais.
Rio, fevereiro de 2015