top of page
ARTIGOS

UMA NOVA SOLUÇÃO PARA UMA VELHA QUESTÃO...

 

Ayrton Sérgio Rochedo Ferreira

 

Em todo o conhecimento disponível sobre comportamento humano, não há nenhuma indicação que nos permita afirmar que pessoas insatisfeitas trabalhem melhor. A realidade objetiva nos mostra exatamente o contrário: pessoas insatisfeitas normalmente trabalham com baixo desempenho, que pode ser constatado no produto final de seu trabalho, na motivação com que o executam ou no comprometimento com que se engajam nele. A questão passa a ser então:

 

  • A satisfação que as pessoas precisam para trabalhar poderá vir do próprio trabalho?

  • Em que medida os gestores serão responsáveis por isso?

 

Neste ponto o mundo empresarial parece se dividir em dois: numa parte estão os gestores que acham que os fatores de satisfação são inatingíveis na sua totalidade e que, portanto, as pessoas nunca estarão completamente satisfeitas no seu trabalho, não valendo a pena, portanto, dedicar-se a esta questão; na outra parte estão aqueles que, com sabedoria, obtém equipes satisfeitas e motivadas.

 

O que divide os gestores nestes dois mundos? Talvez a forma como eles vivam a vida organizacional. Uns trabalham para cima, para a satisfação dos chefes.

 

Como, intrinsecamente, trabalhar para chefe não é uma fonte legítima de prazer, mas de segurança e sobrevivência profissional, eles também não concebem como suas equipes podem experimentar algum prazer no trabalho, já que eles próprios só experimentam o peso de se manterem alertas, a cada dia, antecipando-se às cobranças e reclamações da hierarquia superior. 

 

Sendo assim, concebem que todos devem colocar o foco de sua atividade na atenção e prioridade aos níveis superiores, para garantirem sustentação e sobrevida organizacional.

 

Outros gestores, ao contrário, trabalham para seus clientes internos e externos, na cadeia de atendimento, retirando desta perspectiva verdadeiros desafios que torna prazeroso e gratificante o seu trabalho.

 

Estes reafirmam permanentemente o sentido de seu desempenho pelo feedback de seus clientes e experimentam a gratificação pelo desempenho de suas equipes, quando visualizam o impacto positivo de seus serviços e produtos no valor que agregam ao negócio e nos resultados da Organização. [1]

 

A principal diferença entre trabalhar para cima – atendendo a estrutura hierárquica - e trabalhar para o processo, na direção do atendimento aos clientes, repousa na racionalidade do que seja trabalhar para uma Organização de negócios.

 

Se perguntarmos a um padeiro com se faz o pão, dificilmente ele nos responderá com o desenho do organograma da padaria. Simplesmente ele nos descreverá, com palavras ditadas pela prática do dia a dia, o processo produtivo daquele estabelecimento, assim como ele o enxerga, desde a abertura do saco de farinha até o transporte dos pães para o balcão, onde aguardam os "fregueses" habituais. Isto porque o pão se faz no processo horizontal.  A estrutura hierárquica, efetivamente, não faz o pão; ela existe para garantir as condições para que ele seja feito da melhor forma possível, ao longo do processo.

 

A partir da perspectiva do cliente e da nova lógica organizacional, talvez tenhamos uma resposta nova e alentadora quanto à questão de satisfação no trabalho.

 

Os psicólogos e especialistas em desempenho organizacional sempre recomendaram novos desafios, maiores responsabilidades e autodesenvolvimento como forma de se criar climas motivadores que despertassem o comprometimento das equipes. A implementação destas soluções, no entanto, sempre se  deu sob a ótica da autoridade hierárquica,  da organização funcional; com este olhar, as responsabilidades e desafios adicionais propostos se traduziam em novas formas de atender ao chefe e o autodesenvolvimento significava buscar novos conhecimentos e habilidades para se aproximar mais das expectativas e da competência da chefia e para futuras promoções.

 

Assim, o objeto maior do investimento nunca foi o cliente e sim o chefe ou a estrutura hierárquica. Essa é a velha questão! A administração nasceu e se desenvolveu para atender ao chefe e esta cultura retira do trabalho uma boa parte da satisfação que as pessoas poderiam nele encontrar, porque enquadra a intenção do bom desempenho somente na manutenção de uma certa fidalguia do subordinado ao superior. É como se o desempenho de uma pessoa tivesse por finalidade única agradar a uma outra que, pela hierarquia, detivesse o poder sobre a sua sorte na Organização.

 

No momento em que uma equipe percebe a relação clara entre seus desempenhos e a satisfação dos seus clientes, internos ou externos e, mais ainda, percebe os efeitos daí resultantes, todos se sentem trabalhando por um objetivo maior, que é de todos e interessa ao futuro de cada um. Essa, talvez, seja a nova solução para uma velha questão: desapropriar dos chefes os desempenhos das suas equipes.

 

Esses  desempenhos não foram feitos para seu proveito, assim como os frutos colhidos não foram feitos para o proveito do agricultor, uma vez que foram plantados com a intenção do mercado. A menos que se trate de agricultura de subsistência, em que cada um planta para si próprio. Mas isto, em termos de empresa, nós sabemos aonde vai dar...

 

Saberão os gestores alinhar os desempenhos de suas Equipes para o atendimento das demandas de seus clientes e com espírito de serviço, que constrói a verdadeira liderança, remover obstáculos, estimular e criar condições de motivação e comprometimento? Ou estes  desempenhos, obtidos a custa de muita pressão, continuarão servindo somente à estrutura hierárquica, para evitar reclamações superiores e atender à cobrança implacável dos “chefes dos chefes”?

 

Quantos desafios, extremamente mais racionais e gratificantes e quantas novas responsabilidades, verdadeiramente críticas e impactantes, nós poderíamos assumir se colocássemos nossas perspectivas de desenvolvimento no melhor atendimento aos nossos clientes internos e externos?  Sob esta nova ótica, quem duvida que o trabalho possa gerar satisfação legítima para quem o executa?

 

[1] Herzberg examina esta questão em seu clássico artigo “Mais uma vez: como motivar seus funcionários?”. (Herzberg, Frederick: HBR Classic, 1987).

bottom of page